
Um estudo feito com quase 190 mil atendimentos pediátricos em um hospital da Austrália revelou que a intuição dos pais pode ser mais eficaz do que os sinais vitais para identificar doenças graves em crianças.
A pesquisa foi realizada pela Universidade Monash, em Melbourne, e publicada nessa quinta-feira (29/5) na revista The Lancet Child & Adolescent Health.
A principal conclusão do estudo é que, quando os pais dizem estar preocupados com a piora do estado de saúde dos filhos, há uma chance significativamente maior de que a criança realmente esteja em situação crítica, mesmo quando os sinais vitais ainda não indicam isso.
Os pesquisadores sugerem que a percepção dos pais ou cuidadores deve ser considerada parte do processo de decisão clínica, e não apenas um complemento.
Como o estudo foi feito?
O trabalho foi conduzido ao longo de 26 meses no Monash Children’s Hospital. A equipe analisou registros de mais de 73 mil crianças atendidas no pronto-socorro. Em cerca de 24 mil desses casos, os pais ou responsáveis responderam à pergunta: “Você está preocupado que seu filho esteja piorando?”.
Em 4,7% das vezes, os pais expressaram preocupação com a deterioração do quadro clínico. Nessas situações, as crianças tinham quatro vezes mais chances de precisar de tratamento em uma unidade de terapia intensiva (UTI), em comparação com as que não tiveram pais preocupados.
Os dados mostraram que, quando os pais relataram um sinal de alerta, os pacientes tinham mais chance de precisar de ventilação mecânica e ficavam internados por quase três vezes mais tempo.
O estudo também comparou a percepção dos pais com sinais vitais anormais, como mudanças na frequência cardíaca ou respiratória. A intuição dos pais foi um indicativo mais forte de que a criança precisaria de UTI do que qualquer um dos sinais fisiológicos analisados isoladamente.
“Ao longo dos anos, ouvimos muitas histórias de pais que não foram levados a sério e, depois, passaram por situações trágicas. Mas os dados mostram que, se um pai ou mãe está preocupado, essa preocupação realmente tem fundamento clínico”, disse Erin Mills, autora do estudo e pesquisadora da Universidade Monash, em entrevista ao The Guardian.
Tragédia impulsionou mudanças no Reino Unido
O papel dos pais nas decisões médicas virou debate no Reino Unido após a morte de Martha Mills, uma adolescente de 13 anos que sofreu uma queda de bicicleta e desenvolveu sepse durante a internação. Apesar de alertarem os médicos várias vezes sobre a piora do quadro, os pais foram ignorados.
O caso, ocorrido em 2021, teve grande repercussão no país e resultou na criação da Regra de Martha no sistema de saúde britânico (NHS). A norma garante aos pacientes e familiares o direito de pedir uma segunda opinião médica urgente. Dados recentes do NHS indicam que a medida tem contribuído para tornar os atendimentos mais seguros.